Mais inteligência erótica, por favor
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- Publicado sexta, 05 janeiro 2018
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Autor
Tamar
A sociedade atual coloca-nos um paradoxo curioso: valoriza e premeia a criatividade, a novidade e a variedade, ao mesmo tempo que baseia a sua economia na normalização e uniformização de produtos. Promete-nos a felicidade… lembrando-nos constantemente do que nos falta, do que ainda precisamos para lá chegar.
Por isso, muitos de nós, a páginas tantas, sentem o peso e o aborrecimento da vida moderna. E pode ir-se, infelizmente, da apatia à depressão num ápice. cada vez mais. Falta-nos a inspiração, o mistério, o brilho. Temos saudades da leveza de ser e da beleza natural das coisas e das pessoas.
Esse é o domínio do erotismo e entrar nele é o que precisamos urgentemente. Não aumenta a conta bancária, não mantém as funções vitais do corpo a funcionar mas faz a vida valer a pena! Precisamos recuperar o seu sentido original pois outro paradoxo moderno é o de uma sociedade hipersexualizada, obcecada com as imagens sexuais explícitas e, ao mesmo tempo, hipoerotizada, isto é, com muita falta de ingredientes para a imaginação e os restantes sentidos, além da visão. É que o bom sexo é aquele em que se sai da realidade comum e se vai para fora de nós, num tempo sem tempo, num espaço sem espaço, plenos de sensações, imaginação e paixão!
Aqui os principais traços da inteligência erótica:
Aceita a alma do sexo - o sexo nem sempre é literal, o sexo não é meramente uma descarga de tensão, o sexo empobrece se feito mecânica e rotineiramente. A inteligência erótica valoriza a vida, o entusiasmo, a criação, o afeto e os mistérios do corpo e de tudo o que é extraordinário. A sexualidade erotizada liga diretamente a pessoa à expressão livre de quem é e predispõe à ligação e apreciação da verdade da sua parceria;
Baseia-se nos sentidos e na imaginação - a inteligência erótica está ligada à exploração atenta dos 5 sentidos e chama a atenção para a importância de introduzir nas nossas vidas diárias variedade de cores, sabores, texturas, paisagens, hábitos. Dota-nos, igualmente, da capacidade de tornar a nossa imaginação mais vívida, mais rica, mais real, descobrindo os nossos limites, sem reprimi-los excessivamente;
Aponta para o coração - essa predisposição para a revelação e para a partilha não é mental, mas provém de um coração aberto e recetivo. A inteligência erótica desperta o sentir e deixa o pensar em segundo plano. Permite a cada pessoa abrir-se a possibilidades desconhecidas e aceder a orgasmos emocionais, além de físicos; desenvolve a capacidade de ser empático e generoso no acto sexual ou permitir que o relacionamento leve ao resto da vida um espírito de alegria, prazer, intimidade, amor e vitalidade;
Vê a energia erótica presente em tudo o que tem ânimo - terra, animais, arte, crianças, adultos e idosos - diluindo as fronteiras entre o que é sagrado e o que é profano e exalta o seu cariz criativo e expressivo, lembrando-nos que todos nós somos artistas e que a nossa mestria está naquilo que, precisamente, nos anima;
Reconhece a beleza - não se limita a estereótipos nem a atributos corporais específicos e concentra-se no brilho da alma e no caráter que pode ser visto na luz do olhar, na energia do caminhar, no jeito de falar da pessoa, justo aquilo que a torna tão humana e tão divina, como o escritor D.H. Lawrence viu:
“ O que é belo num homem
Senão o reflexo de um deus nele?
O que é belo numa mulher
Senão o reflexo de uma deusa nela?”
Não se limita ao convencional e cuida dos espaços e dos acessórios com um sentido estético refinado (mas ao gosto de cada um) para favorecer o sexo liminar, o tal que nos faz pairar entre carne e espírito, terra e céu.
Como podes desenvolver a tua inteligência erótica?
Usa plenamente os 5 sentidos - a maioria das pessoas está com os sentidos debilitados, simplesmente porque vive mais na cabeça do que no corpo. Lembra-te que há mais sentidos que a visão (a que é forçosamente mais estimulada). Quando estiveres a olhar para o mar, por exemplo, lembra-te de sentir o seu aroma e, para além da temperatura, a sua textura e o que o toque da água na tua pele te faz sentir. Aplica esta prática de mindfulness para quando cozinhas, caminhas e nas restantes atividades diárias, convocando, sempre que possível, os sentidos para a experiência em si;
Descobre o que é erótico para ti - larga o espartilho das convenções morais bafientas, liga-te aos sentidos e à imaginação e identifica o que mais te desperta boas sensações, sentimentos e estados de alma. Começa por ver isso em ti mesmo, no teu trabalho, nas atividades de lazer, nos ambientes que frequentas. Igualmente, recapitula as melhores memórias eróticas (sexuais ou, simplesmente, prazerosas) e vê como as podes viver novamente, só na mente ou no presente. Tudo a que acederes com este exercício, é o melhor alimento para o teu corpo erótico. Nutre-o;
Vai à natureza - com os sentidos e com a imaginação. A natureza é mestre em ensinar acerca da mudança cíclica - há sempre algo a despertar e algo a morrer em cada estação, em cada dia. Na natureza sentimos como há algo mais vasto que o nosso umbigo e relembramos como tudo está ligado. A natureza não controla, flui; dá e recebe, não retém. Tão erótica!
Pratica o “Awww” - permite-te ser impactado pela magia de algumas situações, treina a observação dos pequenos (grandes) milagres que desfilam à tua frente constantemente, desfruta da presença genuína das pessoas e animais ao teu redor. Respira para dentro do peito essas sensações, espalha-as pelo corpo todo e suspira. Repete.
Foi um prazer escrever cada palavra. Será maior ainda se para ti for um prazer lê-las!
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